Fevereiro é o mês de conscientização do Marfan.

Dedico esse post a todas as pessoas com Marfan e suas famílias. Acredito que a informação seja o bem maior, só com informação seremos capazes de levá-los a alcançarem uma vida plena!

Conscientizar as pessoas sobre Marfan leva a diagnóstico precoce, tratamento adequado e maior tempo de vida. Essa condição ainda é pouco diagnosticada, mesmo no meio médico.

Tipicamente essas pessoas são altas, magras,

têm a envergadura (distância entre os dois braços estendidos) maior que a altura.

Podem ter o peito escavado, curvaturas na coluna (escoliose),

articulações muito flexíveis,

pé chato, dentre outras características.

Marfan é uma desordem genética que afeta o tecido conjuntivo (conectivo) do corpo.

O tecido conectivo “segura” todas as células do corpo, órgãos e tecidos (como o cimento segura os tijolos na parede).

Ele também é importante para o desenvolvimento e crescimento adequados do corpo.

1 a cada 5.000 pessoas significa que durante um jogo no Maracanã lotado podemos ter 16 pessoas com Marfan dentro do estádio (inclusive dentre os jogadores).

Sem o diagnóstico e o tratamento apropriados essas pessoas correm risco de traumas nos olhos (com possibilidade de cegueira), coração, articulações e até morte súbita. 

O sistema cardiovascular (coração e vasos sanguíneos) é um dos mais atingidos no Marfan. O tecido conectivo funciona como um cimento entre as células do nosso corpo. Se o cimento fica “frouxo” pode haver enfraquecimento da parede das artérias e de outras estruturas do coração como as valvas (que funcionam como portas dentro do coração).

O enfraquecimento da parede da aorta (a principal artéria do corpo) leva à sua dilatação e pode ocorrer dissecção (quando ocorre um rasgo entre as camadas da parede da artéria), e até sua ruptura, podendo levar à morte súbita.

Pessoas com Marfan têm 250 vezes mais probabilidade de terem dissecção de Aorta que a população em geral.

Todo indivíduo com Marfan deve consultar um cardiologista regularmente e realizar o ecocardiograma (que é um ultrassom do coração) também regularmente.

Outros exames como a ressonância magnética e a tomografia também podem ser necessários durante o seguimento.

A dilatação da aorta não traz sintomas, daí a importância dos exames de imagem como o ecocardiograma.

A dissecção de aorta geralmente é associada a dor forte no peito, que pode se irradiar para as costas e pescoço. Pode haver falta de ar e perda da consciência. A dissecção de aorta é uma EMERGÊNCIA médica. 

Marfan é uma desordem genética que, como já falei, afeta o tecido conjuntivo (conectivo) do corpo.

O tecido conectivo “segura” todas as células do corpo, órgãos e tecidos (como o cimento segura os tijolos  na parede).

90% dos indivíduos com Marfan têm mutações no gene FBN1 (fibrilina-1) que codifica a produção da Fibrilina-1 (uma proteína que forma as fibras elásticas do tecido conectivo). Mas outros genes também podem ser responsáveis pela doença.

Veja na figura abaixo como a fibrilina-1 normal “segura” o complexo contendo a TGF beta, de forma que ele fique INATIVO.

A fibrilina-1 anormal não consegue “segurar” esse complexo e libera no organismo um excesso de TGF beta ATIVA, que está envolvida em uma série de processos em todo o corpo, causando dentre outros problemas, destruição de células (apoptose).

E qual a importância disso tudo?

Antigamente o tratamento do Marfan se baseava apenas no uso de medicamentos para baixar a pressão (beta bloqueadores) para reduzir a tensão na parede da aorta (que como expliquei, tem maior risco de ruptura pela fragilidade de sua parede).

ATUALMENTE usamos também os Bloqueadores de Receptores de Angiotensina (BRA) como a Candesartana, Losartana… que podem ter ação importante na redução do TGF beta (que em excesso, é o vilão não só na síndrome de Marfan, como em outras doenças).

A maioria dos médicos tem o conceito de que o Marfan é doença autossômica dominante. Esperamos portanto, que um dos pais seja sempre afetado.

Muitos não sabem que 25% a 30% são novas mutações, sendo o primeiro caso da família.

Qual a importância disso?

Nos primeiros anos da criança, as características físicas mais marcantes do Marfan podem não ser tão evidentes e sem as características físicas em um dos pais, muitos esquecem da possibilidade desse diagnóstico. Com isso o tratamento é postergado ou até nunca iniciado.

Veja ao lado que, nem sempre, Marfan tem “carinha” de Marfan.

O diagnóstico do Marfan em geral é clínico (o médico geneticista usa os critérios de Ghent necessitando muitas vezes de uma avaliação multidisciplinar: ortopedista+ oftalmologista+ cardiologista, dentre outros). 

O ecocardiograma é muito importante no diagnóstico e seguimento desses pacientes.

O estudo genético pode ter importância no diagnóstico e também na estratificação de risco e tratamento. 

O diagnóstico de Marfan pode ser desafiador.

Mesmo diante de membros da mesma família, os sinais e sintomas podem variar MUITO, tanto em característica quanto em gravidade. Cabe ao PEDIATRA e ao CLÍNICO geral “alinhavar”, juntar essas características e solicitar a avaliação formal do GENETICISTA, além de atentar para as 

CARACTERÍSTICAS ORO FACIAIS

Essas características também podem chamar a atenção do ODONTOLOGISTA, OTORRINOLARINGOLOGISTA…

  • dolicocefalia (crânio longo e estreito), hipoplasia malar, enoftalmia (olho fundo na órbita), retrognatia (queixo “pequeno” “para trás”), fendas palpebrais oblíquas para baixo, palato ogival, arcadas dentárias estreitas e apinhamento dos dentes.

Os tecidos mais frequentemente afetados são: Coração e vasos sanguíneos, ossos e os olhos.

O sistema cardiovascular pode ser a fonte de maior preocupação ao longo da vida de um paciente com Marfan (como já vimos aqui), mas não pode ser o único foco . 

A abordagem deve ser sempre MULTIDISCIPLINAR.

CARDIOLOGIA/ ECOCARDIOGRAFIA:

Dilatação da aorta, dissecção da aorta (quando a parede da artéria se rasga), prolapso da valva mitral, prolapso da valva tricúspide, dilatação da artéria pulmonar, calcificação do anel mitral em < 40 anos. 

No Marfan, geralmente a dilatação da aorta inclui o seio de Valsalva mas nunca devemos nos contentar em medir a aorta ascendente apenas na raiz (seios de Valsalva). Devemos sempre tentar medir acima da junção sino tubular (em adultos, pelo menos 4 cm acima de sua emergência do ventrículo esquerdo), ao nível do arco e também avaliar a aorta abdominal.

Paciente de 4 anos: corte de quatro câmaras: prolapso valvar mitral e tricúspide.
Paciente de 4 anos: corte paraesternal longitudinal: prolapso valvar mitral e dilatação da aorta (seios de Valsalva)
Paciente de 4 anos: corte paraesternal longitudinal de via de entrada de VD: prolapso valvar tricúspide
Paciente de 4 anos: corte paraesternal eixo curto: dilatação da artéria pulmonar e aorta.

OFTALMOLOGIA: por @dra.marcelavalenca do @ior.oficial

Os erros de refração mais comuns são miopia e astigmatismo. O paciente apresenta dificuldade principalmente para longe, e sensibilidade aumentada à claridade. 

Muitos indivíduos com Marfan apresentam uma alteração chamada ectopia lentis, que significa deslocamento do cristalino. Essa condição causa alterações na refração que baixam a qualidade da visão. Muitas vezes é o primeiro sinal do Marfan.

Descolamento da retina: perda de campo visual ou “uma mancha preta” na visão.

Outra condição muito importante é o descolamento da retina. O paciente, em geral, apresenta perda de campo visual (ou, muitos referem, uma “mancha preta na visão”). O tratamento é cirúrgico e necessita de atenção imediata por Oftalmologista. 

Os trabalhos também mostram alterações menos comuns, porém também importantes nos pacientes com Marfan, como afinamento da córnea, glaucoma e aparecimento precoce de catarata. 

Marfan é a principal condição associada ao deslocamento do cristalino, como muito colegas sabem.

Entretanto, vale a pena reforçar alguns outros sinais de alerta que podem ser decisivos na suspeita de síndrome de Marfan, de forma precoce, ainda no consultório oftalmológico. São eles:

Megalocórnea; Subluxação superotemporal do cristalino; Alterações no ângulo da câmara anterior e glaucoma; Pouca ou nenhuma dilatação pupilar; Iridodonese(que é a vibração da íris durante o movimento dos olhos); Miopia e astigmatismo; Degenerações retinianas do tipo lattice; Descolamento de retina. 

Iridodonese

Os oftalmologistas gerais devem estar atentos a estes sinais, bem como aos sinais sistêmicos do paciente. O diagnóstico precoce e acompanhamento correto ajudam a diminuir a chance de baixa importante na acuidade visual desses pacientes a longo prazo.

ORTOPEDISTA/ PEDIATRA

Pectus carinatum, pectus excavatum (principalmente se for necessária cirurgia); envergadura (que é a extensão dos braços) / altura > 1,05; segmento superior do corpo menor que segmento inferior (pernas longas); aracnodactilia (dedos finos e compridos);

escoliose > 20° ou espondilolistese; redução da extensão dos cotovelos (< 170°); deslocamento medial do maléolo medial causando pé plano; protrusão acetabular (na radiografia); hipermobilidade articular.

ODONTOLOGISTA/ ORTODONTISTA; OTORRINOLARINGOLOGISTA; CARDIOLOGISTA; PEDIATRA

Já falei para vocês sobre as características ORO FACIAIS desses indivíduos, dentre elas: retrognatia (queixo “pequeno” “para trás”), palato ogival, arcadas dentárias estreitas…

Qual a importância disso?

Essas características deixam alguns pacientes predispostos a apneia obstrutiva do sono. 

As quedas na saturação de oxigênio causadas pelas apneias desencadeiam resposta do sistema nervoso simpático, descarga de adrenalina (o hormônio do estresse) levando a taquicardia e picos de hipertensão arterial (aumento da pressão). ️Essas respostas são deletérias no Marfan pois favorecem a dilatação da aorta e até dissecção (quando a parede da artéria se rasga) e alguns trabalhos também associam as apneias a maior incidência de arritmias. 

A avaliação e seguimento por ORTODONTISTA e por vezes, do OTORRINO (podendo incluir polissonografia…), são fundamentais.

Os aparelhos ortodônticos podem ampliar a via aérea mas alguns pacientes podem se beneficiar também do uso de aparelhos como BiPaP ou CPAP.

A visita regular ao DENTISTA também é importantíssima já que a limpeza adequada dos dentes é fator fundamental na prevenção de endocardite (infecção do coração) a que alguns pacientes com Marfan podem ser suscetíveis (já que muitos têm prolapso da valva mitral…) Aqui no meu site você pode abrir a aba “DOENÇAS” e em seguida “ENDOCARDITE INFECCIOSA” para saber um pouco mais sobre isso.

ATIVIDADE FÍSICA

A atividade física deve ser sempre estimulada sendo primordial na vida desses indivíduos. No entanto, deve ser sempre orientada pelos especialistas que o acompanham, principalmente o oftalmologista e cardiologista, já que pode ser necessário que se evitem as atividades físicas com impacto, que podem aumentar o risco de deslocamento do cristalino dos olhos, além de lesão da aorta, dentre outros.

Algumas dessas fotos e outras vocês podem encontrar também em http://bit.ly/MarfanFaces

SAÚDE MENTAL

Como em qualquer condição crônica, o Marfan pode trazer entristecimento para o paciente e/ ou sua família. Procure sempre ter uma rede de apoio, reserve um tempinho para o que gosta de fazer e, se necessário, procure a ajuda especializada de um psicólogo. É necessário viver sempre o dia de HOJE, tentando não imaginar o que poderá ocorrer no futuro, fato que pode estar carregado de angústias e perguntas que nem sempre podem ser respondidas. A dor e o sofrimento são inerentes à vida de qualquer ser humano, justamente pelo fato de sermos passageiros e de que nada seja permanente, mas a maior parte do sofrimento humano é desnecessário, é reflexo da ansiedade trazida pela tentativa em antever o que está por vir.

Se você tem facilidade com a língua inglesa, procure mais informações na página The Marfan Foundation | Know the Signs | Fight for Victory e siga-os também em suas redes sociais como o instagram @themarfanfoundation .